Stephen Kanitz, em uma de suas palestras. Para saber mais acesse: http://blog.kanitz.com.br/ |
No
artigo abaixo, o economista e conferencista brasileiro Stephen Kanitz,
problematiza o problema da escola brasileira, fundamentada no “decoreba”, e
apresenta uma solução inovadora por aqui, mas utilizada pela Universidade de
Harvard desde o século passado: o ensino e aprendizado a partir de problemas.
Vale lembrar, esse é o método utilizado para ensinar Filosofia há
mais de 2.500 anos.
Agora, vamos ler para entender as razões do E.U.A. produzir tanto conhecimento inovador, e nós não.
Aprendendo a pensar
Por Stephen Kanitz
A maioria das aulas que tive foi
expositiva. Um professor, normalmente mal pago e por isso mal-humorado, falava
horas a fio, andando para lá e para cá. Parecia mais preocupado em lembrar a
ordem exata de suas idéias do que em observar se estávamos entendendo o assunto
ou não.
Ensinavam as capitais do mundo, o
nome dos ossos, dos elementos químicos, como calcular o ângulo de um triângulo
e muitas outras informações que nunca usei na vida. Nossa obrigação era anotar
o que o professor dizia e na prova final tínhamos de repetir o que havia sido
dito.
A prova final de uma escola
brasileira perguntava recentemente se o país ao norte do Uzbequistão era o
Cazaquistão ou o Tadjiquistão. Perguntava também o número de prótons do ferro.
E ai de quem não soubesse todos os afluentes do Amazonas. Aprendi poucas coisas
que uso até hoje. Teriam sido mais úteis aulas de culinária, nutrição e
primeiros socorros do que latim, trigonometria e teoria dos conjuntos.
Curiosamente não ensinamos nossos
jovens a pensar. Gastamos horas e horas ensinando como os outros pensam ou como
os outros solucionaram os problemas de sua época, mas não ensinamos nossos
filhos a resolver os próprios problemas.
Ensinamos como Keynes, Kaldor e
Kalecki, economistas já falecidos, acharam soluções para um mundo sem
computador nem internet. De tanto ensinar como os outros pensavam, quando
aparece um problema novo no Brasil buscamos respostas antigas criadas no
exterior. Nossos economistas implantaram no Brasil uma teoria americana de
"inflation targeting", como se os americanos fossem os grandes
especialistas em inflação, e não nós, com os quarenta anos de experiência que
temos. Deu no que está aí.
De tanto estudar o que intelectuais
estrangeiros pensam, não aprendemos a pensar. Pior, não acreditamos nos poucos
brasileiros que pensam e pesquisam a realidade brasileira nem os ouvimos.
Especialmente se eles ainda estiverem vivos. É sandice acreditar que
intelectuais já mortos, que pensaram e resolveram os problemas de sua época,
solucionarão problemas de hoje, que nem sequer imaginaram. Raramente ensinamos
os nossos filhos a resolver problemas, a não ser algumas questões de
matemática, que normalmente devem ser respondidas exatamente da forma e na
seqüência que o professor quer.
Matemática, estatística, exposição de
idéias e português obviamente são conhecimentos necessários, mas eu
classificaria essas matérias como ferramentas para a solução de problemas,
ferramentas que ajudam a pensar. Ou seja, elas são um meio, e não o objetivo do
ensino. Considerar que o aluno está formado, simplesmente por ele ter sido
capaz de repetir os feitos intelectuais das velhas gerações, é fugir da
realidade.
Num mundo em que se fala de
"mudanças constantes", em que "nada será o mesmo", em que o
volume de informações "dobra a cada dezoito meses", fica óbvio que
ensinar fatos e teorias do passado se torna inútil e até contraproducente. No
dia em que os alunos se formarem, mais de dois terços do que aprenderam estarão
obsoletos. Sempre teremos problemas novos pela frente. Como iremos enfrentá-los
depois de formados? Isso ninguém ensina.
Existem dezenas de cursos
revolucionários que ensinam a pensar, mas que poucas escolas estão utilizando.
São cursos que analisam problemas, incentivam a observação de dados originais e
a discussão de alternativas, mas são poucas as escolas ou os professores no
Brasil treinados nesse método do estudo de caso.
Talvez por isso o Brasil não resolva
seus inúmeros problemas. Talvez por isso estejamos acumulando problema após
problema sem conseguir achar uma solução.
Na próxima vez em que seu professor
começar a andar de um lado para o outro, pense no que você está perdendo.
Poderia estar aprendendo a pensar.
Estimulando a curiosidade
Richard Feynman, Prêmio Nobel, ministrando aula. |
Durante a estada de Richard Feynman
no Brasil - um dos poucos ganhadores do Prêmio Nobel que o Brasil pôde conhecer
de perto -, os alunos pediram a ele que desse uma aula sobre nossos métodos de
ensino na área da física. Feynman pegou cinco ou seis livros de física adotados
pelo MEC naquela época e um mês depois disse que só daria aquela aula no último dia de sua permanência no país.
No dia fatídico, dezenas de
professores de física se reuniram para ouvir sua palestra. Essa história é
contada por ele no livro Deve Ser Brincadeira, Sr. Feynman.
Começou assim a palestra:
"Triboluminescência, diz no livro de vocês, é a propriedade que certas
substâncias possuem de emitir luz sob atrito". E mostrou como nossos
livros apresentavam a matéria pronta, incentivavam a decoreba, eram
essencialmente chatos e confusos. Isso foi escrito há trinta anos, mas, pelas
queixas dos alunos, nossos livros de física não melhoraram tanto quanto
deveriam.
Segundo Feynman, um livro americano
abordaria a questão de forma um pouco diferente. "Pegue um torrão de
açúcar e coloque-o no congelador. Acorde às 3 da manhã, vá até a cozinha e abra
o congelador. Amasse o torrão de açúcar com um alicate e você verá um clarão
azul. Isso se chama triboluminescência."
Não sei se ficou clara a diferença
que Feynman tentava demonstrar, nem sei se os livros didáticos americanos
continuam os mesmos, mas basicamente nossos métodos de ensino apresentam muita
informação e teoria em vez de despertar a curiosidade.
Criamos alunos tão bem informados que
no Brasil inteligência virou sinônimo de erudição. Inteligente é quem sabe
muito, quem repete as teorias e conclusões dos outros. Um dia ele poderá até
ter opinião própria, mas será difícil se ninguém estimular sua curiosidade.
Sem dúvida, toda sociedade precisa de
pessoas eruditas, aquelas que sabem os caminhos que já foram percorridos.
Erudição não mostra necessariamente inteligência, mas demonstra que a pessoa
tem boa memória.
No mundo moderno, em constante
mutação, inteligência quer dizer outra coisa. Significa enxergar o que os
outros (ainda) não vêem. Isso é próprio de pessoas criativas, pesquisadoras,
curiosas, exploradoras, que encontram soluções para os novos problemas que
temos de enfrentar.
O método de ensino eficaz, segundo
Feynman, deveria formar indivíduos curiosos. O objetivo final de uma aula teria
de ser formar futuros pesquisadores, e não decoradores da matéria. O que mais o
espantou é que nosso ensino de física e química é muito superior ao americano,
algo que todo brasileiro já sabe. Mesmo assim, notou Feynman, o Brasil produz
menos físicos e químicos que os Estados Unidos.
A hipótese que ele levanta é o método
de ensino. Damos muita teoria e informação, mas ensinamos pouco como usar as
informações aprendidas. Por sua vez, os americanos sabem e aprendem muito menos
teoria, mas devotam mais tempo aprendendo como usar a informação apresentada,
sob todos os ângulos.
Suspeito que essa seja a razão de
nosso péssimo desempenho nos testes internacionais administrados pelo Programa
Internacional de Avaliação Estudantil (Pisa), em que o Brasil aparece nas últimas
colocações, inclusive em
física. Os testes do Pisa enfatizam mais o uso da informação
do que a lembrança da informação em si, algo em que o aluno brasileiro se
destaca.
O certo seria, talvez, escrever
livros "didáticos" menos didáticos e mais motivadores, que
estimulassem a curiosidade e fossem mais relacionados com a vida futura de
nossos alunos. Alguns dos livros que avaliei mal estimulam o aluno a virar a
página para o próximo tópico, muito menos poderiam seduzi-lo a se dedicar ao
assunto o resto da vida.
Vamos fazer um simples teste entre 1
000 alunos e descobrir quantos jogaram fora seus livros didáticos após a
formatura e quantos os guardaram como o primeiro volume de uma grande
biblioteca sobre o assunto. Isso nos diria quais os livros didáticos que de
fato estimularam nossa curiosidade, o objetivo principal do ensino moderno.
Observar e Pensar
Não que eu seja contra livros, muito
pelo contrário. Sou a favor de observar primeiro, ler depois. Os livros, se
forem bons, confirmarão o que você já suspeitava. Ou porão tudo em ordem, de
forma esclarecedora. Existem livros antigos maravilhosos, com fatos que não
podem ser esquecidos, mas precisam ser dosados com o aprendizado da observação.
Ensinar a observar deveria ser a tarefa número 1 da educação. Quase metade das
grandes descobertas científicas surgiu não da lógica, do raciocínio ou do uso
de teoria, mas da simples observação, auxiliada talvez por novos instrumentos,
como o telescópio, o microscópio, o tomógrafo, ou pelo uso de novos algoritmos
matemáticos. Se você tem dificuldade de raciocínio, talvez seja porque não
aprendeu a observar direito, e seu problema nada tem a ver com sua cabeça.
Ensinar a observar não é fácil.
Primeiro você precisa eliminar os preconceitos, ou pré-conceitos, que são a
carga de atitudes e visões incorretas que alguns nos ensinam e nos impedem de
enxergar o verdadeiro mundo. Há tanta coisa que é escrita hoje simplesmente
para defender os interesses do autor ou grupo que dissemina essa idéia, o que é
assustador. Se você quer ter uma visão independente, aprenda correndo a
observar você mesmo.
Sou formado em contabilidade e administração. A contabilidade me ensinou a
observar primeiro e opinar (muito) depois. Ensinou-me o rigor da observação, da
necessidade de dados corretamente contabilizados, e também a medir resultados,
a recusar achismos e opiniões pessoais. Aprendi ainda estatística e
probabilidade, o método científico de chegar a conclusões, e finalmente que
nunca teremos certeza de nada. Mas aprendi muito tarde, tudo isso me deveria
ter sido ensinado bem antes da faculdade.
Se eu fosse ministro da Educação,
criaria um curso obrigatório de técnicas de observação, quanto mais cedo na
escala educacional, melhor. Incentivaria os alunos a estudar menos e a observar
mais, e de forma correta. Um curso que apresentasse várias técnicas e treinasse
os alunos a observar o mundo de diversas formas. O curso teria diariamente
exercícios de observação, como:
1.
Pegue uma cadeira de rodas, vá à
escola com ela por uma semana e sinta como é a vida de um deficiente físico no
Brasil.
2.
Coloque uma venda nos olhos e
vivencie o mundo como os cegos o vivenciam.
3.
Escolha um vereador qualquer e
observe o que ele faz ao longo de uma semana de trabalho. Observe quanto ele
ganha por tudo o que faz ou não faz.
4.
Quantas vezes não participamos de uma
reunião e alguém diz "vamos parar de discutir", no sentido de pensar
e tentar "ver" o problema de outro ângulo? Quantas vezes a gente
simplesmente não "enxerga" a questão? Se você realmente quiser ter
idéias novas, ser criativo, ser inovador e ter uma opinião independente,
aprimore primeiro os seus sentidos. Você estará no caminho certo para começar a
pensar.
Parabéns, Calouros de 2007
Mais de 1,5 milhão de jovens
brasileiros começam neste mês a derradeira etapa de sua educação. Meus parabéns!
O grande problema que vocês vão enfrentar é que o conhecimento humano está
dobrando a cada nove meses. Seguindo esse raciocínio, dois anos depois de
formados, entre 60% e 80% de tudo o que vocês aprenderam estará obsoleto,
dependendo da profissão. Isso se seus professores ensinarem o que há de mais
novo em sua especialidade, o que nem sempre acontecerá.
Vocês provavelmente encontrarão três
tipos de professor. Os ultraconservadores, que ainda ensinam
"conhecimentos" de 1880. Na realidade, dogmas de um mundo que não
existe mais. Percebam como vocês encontrarão muito poucos professores que se
definem como neoliberais, neomarxistas, neofreudianos ou neo alguma coisa. Neo
significa novo. No fundo, não são progressistas como dizem, mas
ultraconservadores. Acham que o mundo não mudou ou então pararam no tempo, como
todo conservador.
Outro grupo de professores é o dos
enganadores, aqueles que não se atualizam e dão aulas mesmo assim. Não se
reciclam há anos, ensinam o que era novo dez anos atrás. Ou, pior, ensinam as
mesmas coisas que eles próprios aprenderam quando estudavam. Se tiverem sorte,
vocês também encontrarão um pequeno grupo de professores criativos e
visionários, que criam e mostram como será o mundo de amanhã. São eles que vão
inspirá-los a tentar fazer o que ninguém fez antes, são eles também que
inspiraram quase todos os jovens que inventaram esses sites na internet.
O que muitos de seus professores
ainda não perceberam é que o conceito de conhecimento humano mudou. Não existe
mais o conhecimento perene, guardado a sete chaves, restrito às "lides
acadêmicas". As universidades não são mais as "casas do saber",
as "catedrais do conhecimento", como muitas se autodefinem. Hoje, o
conhecimento humano é de curta duração, poderíamos até dizer descartável, usado
duas ou três vezes e jogado fora, quando não faz mais sentido guardá-lo. Isso
os obrigará a repensar e a gerar novo conhecimento, porque provavelmente o
futuro precisará de soluções nunca vistas.
Estou exagerando um pouco para que
vocês entendam aonde quero chegar. O importante é vocês aprenderem a criar
conhecimento, e não somente a usar o conhecimento do passado. Eu utilizo o
termo administrativo "conhecimento just
in time". Vocês terão muitos problemas a resolver, e terão de
saber como analisá-los, gerando uma solução ou "conhecimento"
apropriado, que não necessariamente servirá para o resto da vida. Daqui a
alguns anos, a situação será outra, requerendo nova análise e solução.
Que algumas coisas são perenes, como
2 + 2 = 4 e muitas leis da física, não há a menor dúvida. Mas o que estou
sugerindo é que vocês tomem o cuidado de sempre questionar seus professores,
para se certificar de que o conhecimento do passado será de fato útil no
futuro. Max Weber, Keynes e Freud escreveriam a mesma coisa se estivessem vivos
hoje? É isso que vocês precisam descobrir. Até pode ser que sim, mas é melhor
desconfiar sempre.
O que eu peço a vocês, calouros de
2007, é que se concentrem em como gerar conhecimento. Como observar, como
identificar variáveis relevantes, os personagens vitais do problema e os
interesses. Como analisar alternativas e tomar decisões. Usei muito pouco das
teorias que me ensinaram na faculdade. Meu sucesso profissional foi devido
muito mais ao conhecimento que eu próprio gerei, que eu mesmo criei, do que às
teorias e técnicas que mal me ensinaram.
A "faculdade" que vocês
precisam adquirir é a da criação, da criatividade, da geração de conhecimento,
e não a da erudição, do academicismo ou a da decoreba que se alastra pelo país.
Infelizmente, vocês terão de agradar
aos dois primeiros tipos de professor repetindo o passado que eles querem
ouvir, senão não serão aprovados. Mas aproveitem os próximos quatro ou cinco
anos procurando e prestigiando os professores criativos, aqueles que de fato
pesquisam o futuro e não somente o passado, e juntos criem o conhecimento para
resolver os problemas atuais do Brasil, e mandem-nos para mim ou coloquem na
internet.
Saibam distinguir quem é quem, e boa sorte!
Qual é o Problema?
Um dos maiores
choques de minha vida foi na noite anterior ao meu primeiro dia de
pós-graduação em
administração. Havia sido um dos quatro brasileiros
escolhidos naquele ano, e todos nós acreditávamos, ingenuamente, que o difícil
fora ter entrado em Harvard, e que o mestrado em si seria sopa. Ledo engano.
Campus da Universidade de Harvard |
O primeiro caso a
ser resolvido naquela noite era de marketing, em que a empresa gastava boas
somas em propaganda, mas as vendas caíam ano após ano. Havia comentários
detalhados de cada diretor da companhia, um culpando o outro, e o caso
terminava com uma análise do presidente sobre a situação.
O caso terminava
ali, e ponto final. Foi quando percebi que estava faltando algo. Algo que nunca
tinha me ocorrido nos dezoito anos de estudos no Brasil. Não havia nenhuma
pergunta do professor a responder. O que nós teríamos de fazer com aquele
amontoado de palavras? Eu, como meus outros colegas brasileiros, esperava
perguntas do tipo "Deve o presidente mudar de agência de propaganda ou
demitir seu diretor de marketing?". Afinal, estávamos todos acostumados
com testes de vestibular e perguntas do tipo "Quem descobriu o
Brasil?".
Harvard queria
justamente o contrário. Queria que nós descobríssemos as perguntas que precisam
ser respondidas ao longo da vida.
Uma reviravolta e
tanto. Eu estava acostumado a professores que insistiam em que decorássemos as
perguntas que provavelmente iriam cair no vestibular.
Adorei esse novo
método de ensino, e quando voltei para dar aulas na Universidade de São Paulo,
trinta anos atrás, acabei implantando o método de estudo de casos em minhas
aulas. Para minha surpresa, a reação da classe foi a pior possível.
Campus da USP (Universidade de São Paulo) |
"Professor,
qual é a pergunta?", perguntavam-me. E, quando eu respondia que essa era
justamente a primeira pergunta a que teriam de responder, a revolta era geral:
"Como vamos resolver uma questão que não foi sequer formulada?".
Temos um ensino no
Brasil voltado para perguntas prontas e definidas, por uma razão muito simples:
é mais fácil para o aluno e também para o professor. O professor é visto como
um sábio, um intelectual, alguém que tem solução para tudo. E os alunos, por comodismo,
querem ter as perguntas feitas, como no vestibular.
Nossos alunos
estão sendo levados a uma falsa consciência, o mito de que todas as questões do
mundo já foram formuladas e solucionadas. O objetivo das aulas passa a ser
apresentá-las, e a obrigação dos alunos é repeti-las na prova final.
Em seu primeiro
dia de trabalho você vai descobrir que seu patrão não lhe perguntará quem
descobriu o Brasil e não lhe pagará um salário por isso no fim do mês. Nem vai
lhe pedir para resolver "4/2 = ?". Em toda a minha vida profissional
nunca encontrei um quadrado perfeito, muito menos uma divisão perfeita, os
números da vida sempre terminam com longas casas decimais.
Seu patrão vai
querer saber de você quais são os problemas que precisam ser resolvidos em sua
área. Bons administradores são aqueles que fazem as melhores perguntas, e não
os que repetem suas melhores aulas.
Uma famosa
professora de filosofia me disse recentemente que não existem mais perguntas a
ser feitas, depois de Aristóteles e Platão. Talvez por isso não encontramos
solução para os inúmeros problemas brasileiros de hoje. O maior erro que se
pode cometer na vida é procurar soluções certas para os problemas errados.
Em minha
experiência e na da maioria das pessoas que trabalham no dia-a-dia, uma vez
definido qual é o verdadeiro problema, o que não é fácil, a solução não demora
muito a ser encontrada.
Se você pretende
ser útil na vida, aprenda a fazer boas perguntas mais do que sair
arrogantemente ditando respostas. Se você ainda é um estudante, lembre-se de
que não são as respostas que são importantes na vida, são as perguntas.
Revolucione a Sala de Aula
Qual a profissão mais importante para
o futuro de uma nação? O engenheiro, o advogado ou o administrador? Vou
decepcionar, infelizmente, os educadores, que seriam seguramente a profissão
mais votada pela maior parte dos leitores. Na minha opinião, a profissão mais
importante para definir uma nação é o arquiteto. Mais especificamente o arquiteto de salas de aula.
Sala de aula - USP |
Na minha vida de estudante freqüentei
vários tipos de sala de aula. A grande maioria seguia o padrão usual de um
monte de cadeiras voltadas para um quadro negro e uma mesa de professor bem
imponente, em cima de um tablado. As aulas eram centradas no professor, o
"lócus" arquitetônico da sala de aula, e nunca no aluno. Raramente
abrimos a boca para emitir nossa opinião, e a maior parte dos alunos ouve o
resumo de algum livro, sem um décimo da emoção e dos argumentos do autor
original, obviamente com inúmeras honrosas exceções.
Nossos alunos, na maioria, estão
desmotivados, cheios das aulas. É só lhes perguntar de vez em quando. Alguns
professores adoram ser o centro das atenções, mas muitos estão infelizes com
sua posição de ator obrigado a entreter por cinqüenta minutos um bando de desatentos.
Não é por coincidência que somos uma
nação facilmente controlada por políticos mentirosos e intelectuais espertos.
Nossos arquitetos valorizam a autoridade, não o indivíduo. Nossas salas de aula
geram alunos intelectualmente passivos, e não líderes; puxa sacos, e não
colaboradores. Elas incentivam a ouvir e obedecer, a decorar, e jamais a ser
criativos.
Sala de aula - Harvard |
A primeira vez que percebi isto foi
quando estudei administração de empresas no exterior. A sala de aula, para
minha surpresa, era construída como anfiteatro, onde os alunos ficavam num
plano acima do professor, não abaixo. Eram construídas em forma de ferradura ou
semicírculo, de tal sorte que cada aluno conseguia olhar para os demais. O
objetivo não era a transmissão de conhecimento por parte do professor, esta é a
função dos livros, não das aulas.
As aulas eram para exercitar nossa
capacidade de raciocínio, de convencer nossos colegas de forma clara e concisa,
sem "encher lingüiça", indo direto ao ponto. Aprendíamos a ser
objetivos, a mostrar liderança, a resolver conflitos de opinião, a chegar a um
comum acordo e obter ação construtiva. Tínhamos de convencer os outros da
viabilidade de nossas soluções para os problemas administrativos apresentados
no dia anterior. No Brasil só se fica na teoria.
No Brasil, nem sequer olhamos no
rosto de nossos colegas, e quando alguém vira o pescoço para o lado é chamado à
atenção. O importante no Brasil é anotar as pérolas de sabedoria.
Talvez seja por isto que tão poucos
brasileiros escrevem e expõem as suas idéias. Todas as nossas reclamações são
dirigidas ao governo - leia-se professor - e nunca olhamos para o lado para
trocar idéias e, quem sabe, resolver os problemas sozinhos.
Se você ainda é um aluno, faça uma
pequena revolução na próxima aula. Coloque as cadeiras em semicírculo. Identifique
um problema de sua comunidade, da favela ao lado, da própria faculdade ou
escola, e tente encontrar uma solução. Comece a treinar sua habilidade de criar
consenso e liderança. Se o professor quiser colaborar, melhor ainda. Lembre-se
de que na vida você terá de ser aprovado pelos seus colegas e futuros
companheiros de trabalho, não pelos seus antigos professores.
Ranking das Universidades USP, que é a melhor Universidade Brasileira, fica 178º lugar. Bom, né? |
Vamos Acabar com as Notas
Damos notas a hotéis, a videogames e
a tipos de café. Mas faz sentido dar notas a seres humanos como fazem as
escolas e nossas universidades? Ninguém dá a Beethoven ou à Quinta Sinfonia uma
nota como 6.8, por exemplo.
O que significa dar uma
"nota" a um ser humano? Que naquele momento da prova, ele sabia x% de
tudo o que os professores gostariam que ele soubesse da matéria. Mas saber
"algo" significa alguma coisa hoje em dia? Significa que você criará
"algo" no futuro? Que você será capaz de resolver os inúmeros
problemas que terá na vida? Que será capaz de resolver os problemas desta nação?
É possível medir a capacidade
criativa de um aluno? Quantos alunos tiraram nota zero justamente porque foram
criativos ou criativos demais? Por isso, não damos notas a Beethoven nem a
Picasso, não há como medir criatividade.
Muitos vão argumentar que o problema
é somente aperfeiçoar e melhorar o sistema de notas, que obviamente não é
perfeito e as suas falhas precisam ser corrigidas.
Mas e se, em vez disso, abolíssemos o
conceito de notas? Na vida real, ninguém nos dará notas a cada prova ou semestre.
Você só perceberá que não está sendo promovido, que as pessoas não retornam
mais seus telefonemas ou que você não está mais agradando.
Aliás, saber se você está agradando
ou não é justamente uma competência que todo mundo deveria aprender para poder
ter um mínimo de desconfiômetro. Ou seja, deveríamos ensinar a auto-avaliação.
Com os alunos se auto-avaliando, dar notas seria contraproducente. Não
ensinamos a técnica de auto-avaliação, tanto é que inúmeros profissionais não
estão agradando nem um pouco como professores e, mesmo assim, se acham no
direito de dar notas a um aluno.
O sistema de "dar" notas
está tão enraizado no nosso sistema educacional que nem percebemos mais suas
nefastas conseqüências. Muitos alunos estudam para tirar boas
"notas", não para aprender o que é importante na vida. Depois de
formados, entram em depressão pois não entendem por que não arrumam um emprego
apesar de terem tido excelentes "notas" na faculdade. Foram enganados
e induzidos a pensar que o objetivo da educação é passar de ano, tirar nota 5
ou 7, o mínimo necessário.
Ninguém estuda mais pelo amor ao
estudo, mas pelas cenouras que colocamos na sua frente. Ou seja, as
"notas" de fim de ano. Educamos pelo método da pressão e punição.
Quando adultos, esses jovens continuarão no mesmo padrão. Só trabalharão pelo
salário, não pela profissão.
Se o seu filho não quer estudar, não
o force. Simplesmente corte a mesada e o obrigue a trabalhar. Ele logo
descobrirá que só sabe ser menino de recados. Depois de dois anos no batente ele
terá uma enorme vontade de estudar. Não para obter notas boas, mas para ter uma
boa profissão.
Robert M. Pirsig, o autor do livro Zen
e a Arte da Manutenção de Motocicletas, testou essa idéia em sala de aula
e, para sua surpresa, os alunos que mais reclamaram foram os do fundão. São os
piores alunos que querem notas e provas de fim de ano. Os melhores alunos já
sabem que passaram de ano, muitos nem se dão ao trabalho de buscar o diploma.
Sem notas, os piores alunos seriam
obrigados a estudar, não poderiam mais colar nas provas e se auto-enganar.
Provas não provam nada, o desempenho futuro na vida é que é o teste final.
Imaginem um sistema geral de
auto-avaliação em que os alunos não mais estudariam para as provas, mas
estudariam para ser úteis na vida. Imaginem um sistema educacional em que a
maioria dos alunos não esqueceria tudo o que aprendeu no 1º ano, mas, pelo
contrário, se lembraria de tudo o que é necessário para sempre.
Criaríamos um sistema educacional em
que o aluno descobriria que não é o professor que tem de dar notas, é o próprio
aluno. Todo mês, todo dia, todo semestre, pelo resto de sua vida.
Volta às Aulas
Jamais esquecerei o meu primeiro dia
de aula na Harvard Business School. No dia anterior recebemos 90 páginas
descrevendo três problemas administrativos que haviam ocorrido anos atrás em
empresas verdadeiras. Tínhamos 24 horas para tomar uma série de decisões,
utilizando as mesmas informações disponíveis da diretoria da época. Era um
problema por matéria, 3 matérias por dia.
O primeiro caso do dia tratava-se de
uma empresa controlada por dois irmãos, bem sucedida por trinta anos, até o dia
em que um deles se desquitou e casou com uma moça vinte anos mais jovem. Esse
pequeno fato desencadeou uma série de problemas que afetava o desempenho da
empresa. Nós éramos os consultores que teriam de sugerir uma saída.
No primeiro dia, na primeira aula, o
professor entrou na sala e simplesmente disse:
- Sr. Kanitz, qual é a sua recomendação para esse caso ?
- Por que eu ?
As aulas a que eu estava acostumado
em toda a minha vida de estudante consistiam num bando de alunos ouvindo
pacientemente um professor que dominava as nossas atenções pelo resto do dia.
Simplesmente, naquele fatídico dia, eu não estava preparado quando todos
viraram suas atenções para mim - e, pelo jeito, eu é que teria de dar a aula.
Esse sistema é conhecido por ensino
centrado no aluno e não no professor. Tanto é que, minha grande frustração foi
ter os melhores professores de administração do mundo, mas que ficavam na
maioria das aulas, simplesmente calados. Curiosamente, falar em aula era uma
obrigação, e não o que em geral acontece em muitas escolas secundárias
brasileiras, em que essa atitude é passível de punição.
Outra descoberta chocante foi
constatar, que a maioria dos famosos livros de administração de nada serviam
para resolver aquele caso. Nenhum capítulo de Michael Porter trata
especificamente de 'problemas de desquites em empresas familiares', um fato
mais comum nas empresas do que se imagina.
A maioria das decisões na vida é de
problemas que ninguém teve que enfrentar antes, e sem literatura
pré-estabelecida. Estamos sozinhos no mundo com nossos problemas pessoais e
empresariais. Quão mais fácil foi a minha vida de estudante no Brasil, quando a
obrigação acadêmica era decorar as teorias do passado de Keynes, Adam Smith e
Peter Drucker, como se fossem livros de auto-ajuda para os problemas do futuro.
Durante dois anos, estudamos mais de
1.000 casos ou problemas dos mais variados tipos: desde desquites, brigas entre
o departamento de marketing e o financeiro, greves, governos incompetentes,
fusões, cisões, falências e até crises na Ásia. Isto nos obrigava a observar,
destilar as informações relevantes, ignorar as irrelevantes, ponderar as
contradições, trabalhar com vinte variáveis ao mesmo tempo, testar
alternativas, formar uma decisão e expô-la de forma clara e coerente.
Estavam ensinando por meio de uma
metodologia inédita na época (1972), o que poucas escolas e faculdades fazem
até hoje: ensinar a pensar.
Stephen Kanitz |
Em nada adianta ficar ensinando como
outros grandes cérebros do passado pensavam. Em nada adianta copiar soluções do
passado e achar que elas se aplicam ao presente.
Num mundo cada vez mais mutável, onde
as inter-relações nunca são as mesmas, ensinar fatos e teorias será de pouca
utilidade para o administrador ou economista de hoje.
Ensinar a pensar também não é tão
fácil assim. Não é um curso de lógica, nem uma questão de formar uma visão
critica do mundo achando que isto resolve a questão. Sair criticando o mundo,
contestando as teorias do passado forma uma geração de contestadores que nada
constrói, que nada sugere.
Minha recomendação ao jovem de hoje é
para que se concentre em uma das competências mais importantes para o mundo
moderno: aprender a pensar e a tomar decisões.
NOSSA ISTO MIM INSPIRO BASTANTE , CRIATIVIDADE E EUMA COISA ESPESIAL
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